1. O olhar fotográfico
de Humberto Mauro
"Humberto Mauro
era antes de tudo um fotógrafo". Esta pode ser uma frase
aparentemente exagerada caso seja lida sem profundidade. Alguns podem
achar que ela ficaria melhor assim: "Humberto Mauro era antes de
tudo um brasileiro patriota". Afinal este cineasta foi considerado
o pai do Cinema Novo por sua obra autoral, pelo seu modo de produção
artesanal e por sempre tratar do Brasil em seus filmes.
No entanto, ao observar cuidadosamente a obra de Humberto Mauro pode-se
perceber que ele era, sim, "antes de tudo um fotógrafo".
E um fotógrafo no sentido mais amplo desta palavra: um criador
de imagens que usa a câmera escura - esta máquina em constante
transformação desde o século XV. Quem sabe o que
virá depois das câmeras de alta definição?
- para mostrar o mundo aos desatentos passageiros. Um indivíduo
sempre observador e cuidadoso na composição de planos
perfeitamente "fotográficos" e de um cinema sutil e
denso.
Vários foram os diretores de fotografia e cenógrafos que
trabalharam com Humberto Mauro desde os primeiros filmes do chamado
"Ciclo de Cataguases", na década de 1920, e clássicos
como Tesouro Perdido (fotografado pelo experiente italiano Pedro
Comello em 1927) e Ganga Bruta (de 1933), até as suas
últimas produções. O diretor de fotografia, Edgar
Brasil - que também esteve no revolucionário Limite, de
Mário Peixoto em 1930, e fotografou diversos filmes da Atlântida,
como Luz dos Meus Olhos (em 1947), de José Carlos Burle,
e chanchadas da década de 50, como É Fogo na Roupa
(em 1952) e Aviso aos Navegantes (em 1950) - foi diretor de fotografia
de Brasa Dormida (em 1928), Sangue Mineiro (em 1930) e
Ganga Bruta.
É bom lembrar que Glauber Rocha equipara a fotografia deste último
"à dos melhores fotógrafos de então"
no capítulo dedicado a Ganga Bruta na sua Revisão
Crítica do Cinema Brasileiro (1). Os filhos de Humberto Mauro:
José A. Mauro (o Zequinha Mauro) e Luiz Mauro, além do
seu irmão Bruno Mauro também foram fotógrafos de
seus filmes.
Sem desmerecer a fundamental e criativa parceria destes profissionais
na criação das imagens da obra cinematográfica
de Mauro, percebe-se uma espécie de "padrão estético"
que percorre seus filmes. Um "padrão" no sentido de
recorrência e não de repetição obrigatória
e vazia. O cuidado extremo e a simplicidade ao enquadrar são
características fortes de seus filmes - é claro que foi
se desenvolvendo a cada produção, mas desde o início
pode-se perceber um olhar atento e criador - e o trabalho com a iluminação
é também outra característica que se sobressai
em alguns filmes, vistos os limites técnicos impostos pela produção
conhecidamente "artesanal".
Por outro lado, é perceptível sua preferência pelo
cenário rural e as tomadas em exteriores - nas quais parece ter
melhores resultados - proporcionando ao espectador inúmeras e
belas cenas. O cineasta quase se assemelha a um pintor paisagista pela
técnica utilizada na composição dos planos.
Como é observado pelo professor e pesquisador da UNICAMP, Fernão
Pessoa Ramos, no texto Hirszman e Mauro, Documentaristas publicado nos
Cadernos da Pós-Graduação do Instituto de Artes
da UNICAMP, Humberto Mauro parece sentir uma necessidade interna de
representar a natureza, expressa nas paisagens, costumes e tradições
de Minas Gerais: "O sentimento maureano por excelência é
a 'saudade' do universo rural, a melancolia" (2), ao mesmo tempo
em que alimentava um enorme apreço pela técnica e pela
modernidade. Talvez por isso, tenha se dado tão bem no INCE -
Instituto Nacional de Cinema Educativo, instituição que
buscava enaltecer o Brasil através de suas maravilhas naturais
e conquistas científicas.
O próprio Mauro assina a fotografia de diversos filmes do INCE,
entre eles O Descobrimento do Brasil, superprodução histórica
que reconstitui a carta de Pero Vaz Caminha quando da chegada dos portugueses
ao Brasil. Entre 1936 e 1939, Mauro fotografou diversos dos chamados
"filmes oficiais" do governo, cobrindo eventos em que o presidente
da república estava presente, quando exercitou seu olhar documental
de fotógrafo. No longa-metragem ficcional Tesouro Perdido, de
1927, também consta o crédito de fotografia ao cineasta
multifacetado - Mauro também atuava como roteirista e ator, além
de ser diretor e fotógrafo dos filmes.
Além disso, há um cuidado no desenvolvimento da cenografia
- os cenários e os figurinos - em alguns de seus filmes, que
precisa ser sublinhado. É perceptível que ele sabia muito
bem como a ambientação da história pode contribuir
para contá-la. Ainda que no já citado Tesouro Perdido,
a casa onde mora a personagem principal seja em estilo neocolonial,
ao invés do tradicional estilo colonial mineiro, o que não
"encaixa" com o período em que se desenvolve a ação
do filme. Mas esta talvez seja uma tentativa de incutir um ar de modernidade
à história (na época do filme Mauro havia iniciado
seu mergulho nas idéias modernizadoras de Adhemar Gonzaga e o
grupo da Revista Cinearte).
Na obra de outros diretores esta espécie de "padrão"
é também um fato nítido e recorrente. Andrei Tarkovski,
o cineasta russo da reflexão e da sensibilidade, mantém
diversos traços estéticos de fotografia e cenografia em
filmes que tiveram a participação de diretores de fotografia
e diretores de arte díspares. Tanto em Nostalgia como Stalker
(e em outros filmes como O Espelho), Tarkovski cria imagens pouco nítidas,
envoltas em brumas, com cores dessaturadas, cenário e figurinos
"envelhecidos", expondo um mundo de sonho, delírio
e pensamento.
Stanley Kubrick, seja em 2001 - Uma odisséia no espaço,
Laranja Mecânica ou De Olhos Bem Fechados, é também
um cineasta bastante esclarecido quando se fala em criação
cenográfica e fotográfica. É clara a sua preocupação
em produzir uma ambientação rebuscada para suas histórias
complexas e seus profundos e "paranóicos" personagens.
Deste modo, a construção estética da imagem nos
filmes de Humberto Mauro tem uma imensa importância no entendimento
de sua obra, assim como contribui para a valorização ainda
maior deste cineasta para história e o cinema brasileiro.
Os filmes comentados neste texto - O Descobrimento do Brasil, Machado
de Assis - Um Apólogo, Argila e os curtas-metragens da série
Brasilianas, todos produzidos entre 1937 e 1958 - fazem parte do período
em que Humberto Mauro esteve no INCE - Instituto Nacional de Cinema
Educativo. Esta fase de sua filmografia muitas vezes é deixada
de lado quando se fala de sua história e sua importância
para o cinema brasileiro, ao mesmo tempo em que foi esteticamente muito
rica, pelo seu modo criativo de tratar temas árduos e aparentemente
infrutíferos e também pelo grande cuidado estético
de Mauro com seus filmes.
2. INCE - Instituto
Nacional de Cinema Educativo
O INCE foi fundado
em 1936 com o objetivo de criar uma "imagem" para o Brasil,
assim como outras instituições como o IPHAN - Instituto
do Patrimônio Histórico Nacional e o Museu Nacional de
Belas-Artes. Nesta mesma época estão surgindo em países
da Europa - Itália, Alemanha, Inglaterra - instituições
semelhantes ao INCE que utilizam o cinema como ferramenta de transmissão
das idéias "oficiais".
O grande arquiteto de sua implantação foi o antropólogo
Edgar Roquette-Pinto. Ele já vinha desenvolvendo atividades no
sentido de alargar os caminhos da comunicação do nosso
país. A implantação do rádio, as incursões
do Marechal Rondon pelo interior do Brasil e a Revista Nacional de Educação,
são alguns dos exemplos de obras das quais este empreendedor
participou.
Quando de sua fundação, a ideologia do Instituto estava
baseada nas teses positivistas de que era tarefa dos "detentores
do conhecimento" passá-lo aos "ignorantes", afinal
o desenvolvimento da ciência era o maior trunfo desta nação
em crescimento, e todos deveriam "ter acesso" a ela e ao sucesso
do país. Acreditava-se na supremacia do saber como salvação
do Brasil e o INCE era o grande motor desta tarefa de "educar"
o povo brasileiro.
O INCE realizava filmes sobre educação física;
cidades históricas; personagens da história nacional e
eventos oficiais do governo, porém a sua produção
dava maior ênfase à ciência. Nesta área foram
produzidos principalmente filmes de divulgação de pesquisas
científicas e filmes de apoio às disciplinas regulares
das escolas.
A seguinte observação feita por Fernão Ramos é
bastante esclarecedora dos objetivos e da ideologia do INCE ao realizar
tais filmes:
"A narrativa documentária serve como ilustração
para temas preparados por cientistas do campo biológico ou das
ciências exatas. Existe nestes documentários um certo deslumbramento,
um certo orgulho, com as novas perspectivas que as conquistas da ciência
abrem ao saber humano, como forma de aplicação da racionalidade
para analisar e classificar" (3).
3. Humberto Mauro no INCE
O INCE sem Humberto
Mauro certamente teria sido um mero gerador de filmes maçantes
e vazios sobre ciência e o cotidiano oficial da política
brasileira. No entanto, este cineasta de Cataguases fez do INCE um fértil
centro de produção de curtas e médias-metragens
que carregam um brilho histórico.
É bastante prazeroso perceber que desde o início da produção
dos filmes do Instituto, Humberto Mauro buscou alternativas para tornar
os temas mais palatáveis. Seja em um institucional do governo,
em reportagens "oficiais" ou em um filme sobre o fóssil
do Homem da Lagoa Santa - em Lagoa Santa, de 1942, Mauro conta um pouco
da história do pesquisador holandês Dr. Peter Lund, ao
invés de apenas ater-se a fatos históricos a respeito
da descoberta do fóssil - o cineasta "(...) acaba por constituir
uma visão pessoal (...)" (4) como afirma a professora e
pesquisadora da UNICAMP, Sheila Schvarzman, em certa altura da introdução
de sua Tese de Doutoramento.
Roquette-Pinto é o fundamental responsável pela liberdade
poética que Mauro tem na produção dos filmes educativos
do instituto. A crença e a confiança no trabalho do colega
permitiram que hoje nós tenhamos uma série de filmes importantes
na história do nosso cinema - não só documental
- ainda que sejam esquecidos pelos críticos de cinema.
São feitas muitas críticas ao engajamento do cineasta
na estrutura do INCE e a seu trabalho tido como burocrático -
que têm um lado verdadeiro. No entanto "(...) em meio à
oficialidade, à ícones preestabelecidos (...)" (5)
Humberto Mauro conseguiu injetar em seus 357 filmes no INCE - algumas
vezes mais, outras menos - sua estética diferenciada.
4. Os filmes
O Descobrimento
do Brasil e Machado de Assis - Um Apólogo
O Descobrimento
do Brasil e Machado de Assis - Um Apólogo são obras exemplares
do cuidado de Humberto Mauro ao construir a cenografia. O primeiro utiliza
a famosa carta de Pero Vaz Caminha como roteiro para contar a história
do "descobrimento" do Brasil. Fazendo ressalvas às
críticas, claramente válidas, de um posicionamento mais
português do que brasileiro do filme nesta história absolutamente
parcial e duvidosa, do ponto de vista da reconstituição
histórica da cenografia O Descobrimento do Brasil é um
filme surpreendente, visto que foi produzido em 1937 sob encomenda do
Instituto do Cacau da Bahia.
O figurino dos portugueses e a caracterização do interior
do navio são elementos de destaque do filme, mostrando o cuidado
na sua criação. O que fica clara é a falta de informação
a respeito de como os índios brasileiros se "vestiam"
e comportavam, já que aquilo que aparece na tela mantém
fidelidade com as descrições da carta de Pero Vaz Caminha
ao rei D. João VI.
Na seqüência final do filme, é quase direta a referência
ao quadro Primeira Missa no Brasil, pintado em 1860 por Victor Meirelles,
um outro ponto de destaque e atenção. O plano parece ter
sido transferido da tela do pintor para a tela do filme.
Em Machado de Assis - Um Apólogo de 1939, o teor surreal do conto
original do escritor modernista contribui para a liberdade na construção
da cenografia, e a composição das cenas dentro da caixa
de costura mantém o clima fantástico do texto. Cada detalhe
da "casa" (a caixa de costura) e do figurino dos personagens
humanizados Agulha e Linha, é composto com esmero. O mundo lúdico
criado através deste cenário - destacado das demais locações
do filme em que percorrem os personagens realmente humanos - torna o
filmete uma seqüência de prazer estético, ao nos lembrarmos
que foi produzido como um filme de "educação popular"
e teve exibição em sala de cinema para inúmeras
pessoas.
Não fosse pelo trecho inicial em que uma locução
em off situa Machado de Assis na história e a contadora de histórias,
Lúcia Miguel Pereira, apresenta o referido conto, Machado de
Assis - Um Apólogo perderia seu tom "oficial" de educação
e seria considerado um curta-metragem ficcional como qualquer outro.
O fotógrafo deste filme é Manoel Ribeiro, porém
seu trabalho torna-se apenas correto por causa da atenção
requerida pela maravilhosa direção de arte das cenas já
comentadas. De modo algum o trabalho de Manoel Ribeiro é diminuído,
entretanto a cenografia acaba tornando-se inevitavelmente a grande estrela
da imagem do filme.
Argila
Argila é
certamente um dos maiores filmes de Humberto Mauro. É importante
ressaltar que este filme faz parte do período em que o cineasta
estava no INCE, mas foi produzido pela Brasil Vita Filmes (da atriz
e produtora Carmen Santos) e contou com o apoio de Roquette-Pinto.
Neste filme, soma-se à tradicional situação de
conflito sexual entre os personagens principais e à tensão
moderno/rural, um trabalho primoroso do fotógrafo Manoel Ribeiro
com a sombra - as cenas em que vemos a ação através
de silhuetas na parede merecem destaque -, além dos enquadramentos
simples e belos.
De modo geral, a fotografia é extremamente eficiente com trechos
de agradável beleza, porém algumas cenas chamam ainda
mais a atenção pela sutileza na sua construção.
Até mesmo no seu trecho "documental", no qual Roquette-Pinto
discorre sobre a cerâmica marajoara, o filme busca soluções
de iluminação e enquadramento diferentes.
Na cena em que os noivos, Marina e Gilberto, conversam no bananal sobre
o trabalho do artista na casa da "fatal" Luciana, o contraste
entre as zonas claras e escuras da imagem, cria na simples cena de diálogo
um ambiente de dúvida. A sombra das folhas no rosto de Gilberto
não nos permite ver seu rosto por completo, enquanto a inocência
do rosto da noiva é preservada pela proteção de
seu chapéu e uma luz difusa e suave. Esta construção
estética, além de ser de grande beleza, se combina perfeitamente
com o conteúdo da conversa, na qual a ingênua Marina questiona
o relacionamento do noivo com a "mundana" patroa.
Outra cena interessante é aquela na qual Luciana vai, no meio
da noite, visitar Gilberto no atelier. Em quase toda a seqüência,
a patroa do artista mantém-se com o rosto encoberto pela sombra,
sublinhando seu caráter misterioso e sedutor, enquanto Gilberto
permanece sob uma luz forte nos permitindo identificar seu constrangimento
(cuja verdade não nos cabe aqui julgar) pela situação
íntima. A dicotomia é maravilhosamente explicitada por
este trabalho de luz contrastada.
A seqüência da festa de São João - as cenas
de festa estão sempre presentes em seus filmes de ficção
como um momento de celebração e união - também
chama a atenção. A fogueira e os fogos de artifício
parecem ser as únicas fontes de iluminação, presenteando
os olhos do espectador com zonas de sombra e pretos profundos em todos
os planos da cena.
As duas seqüências que encerram Argila também merecem
observação. Na penúltima seqüência a
patroa Luciana observa, da porta de seu castelo, o empregado Gilberto
partir pela última vez. Este plano se assemelha a uma tela pintada
à mão ou a uma fotografia, por causa de sua bela composição.
E por fim, a última seqüência do filme, na qual observamos
pela fenda no meio de uma obra de cerâmica marajoara a síntese
final de Argila (antes já ditada por Gilberto ao dizer que "O
mundo é assim, barro, argila"): vasos de cerâmica
sendo destruídos e esmagados em uma série de fusões.
Transições semelhantes acontecem em outros dois trechos
do filme, quando um vaso girando se "transforma" no rosto
do patrão de Gilberto e, em outro momento, uma flor que enche
o quadro se funde com o rosto de Luciana.
Brasilianas
Aqui foi onde Mauro
mais exercitou seu olhar fotográfico. As Brasilianas são
na maior parte das vezes pequenos curtas-metragens montados em clipes
de imagens que combinadas e em conjunto com a música discorrem
sobre temas musicais da cultura popular brasileira.
Nestes filmes, Mauro parece ter se dedicado com maior cuidado estético.
As Canções Populares (Chuá-Chuá, Azulão
e A Casinha Pequenina; entre outras) e os Cantos de Trabalho (especialmente
o Canto do Pilão), são uma maravilhosa amostra da maestria
do cineasta ao compor seus enquadramentos.
Dentre os curtas-metragens da série Canções Populares,
o filme Chuá-Chuá é certamente dos mais surpreendentes
no que diz respeito ao enquadramento. A maneira como a câmera
compõe a paisagem nos limites do quadro consegue trazer o clima
desta canção folclórica brasileira. As flores,
árvores, campos e cachoeiras tornam-se elementos destas fotografias
bem compostas de Humberto Mauro - mesmo que a montagem seja considerada
óbvia ou redundante, de modo que em alguns planos as palavras
da canção se condensem em sua própria representação
imagética.
A preferência por cenas externas novamente é explícita,
Mauro parece sentir-se mais à vontade ao enquadrar os campos
do interior de Minas Gerais e o faz com imensa tranqüilidade e
destreza.
O filme Cantos de Trabalho - Canto do Pilão é outro
exemplo de fotografia simples e bem trabalhada. Nas cenas dos trabalhadores
na roça, a câmera enquadra sempre de baixo ou de cima,
nos revelando ora a sombra dos trabalhadores no chão - criando
um desenho plástico ainda que breve -, ora um céu brilhante
às costas dos homens.
5. Conclusão
Muitos argumentos
foram apresentados neste texto para mostrar a fundamental importância
da postura de fotógrafo de Humberto Mauro na construção
de seus filmes e para que seu cinema tenha permanecido na história
do Brasil.
A necessidade de afirmação destas características
do cineasta veio do fato de que muitas vezes não é dada
a necessária atenção a determinados elementos estéticos
do cinema, a não ser que saltem aos olhos de todos. Porém
tanto a fotografia quanto a cenografia, têm um papel importantíssimo
na construção do conteúdo narrativo e sensorial
de um filme.
Desde superproduções como Blade Runner, em 1982 - direção
de Ridley Scott, fotografia de Jordan Cronenweth, e direção
de arte de Lawrence G. Paull e Peter J. Hampton - até a fantástica
escolha de locação e sua surpreendente exploração
no filme O ano passado em Marienbad - dirigido por Alain Resnais em
1961, com direção de arte do parceiro de longa data, Jacques
Saulnier, e fotografia do consagrado Sacha Vierny - a estética
da imagem e sua contribuição subjetiva à narrativa
cinematográfica compõem e percorrem um caminho paralelo
à trajetória do cinema, funcionando como trilhos nos quais
as histórias se desenvolvem.
Os fotógrafos e cenógrafos que trabalharam com Humberto
Mauro (e que se tornaram referências do cinema brasileiro, como
Edgar Brasil) conseguiram transpor para a tela a imaginação
estética do cineasta em belíssimas imagens. Pode-se até
dizer que elas já estavam em sua cabeça e com o auxílio
destes competentes parceiros foram apenas extraídas para o negativo
cinematográfico.
Alguns estudiosos e teóricos do cinema em seus ensaios e comunicações
procuram se ater aos elementos estéticos da imagem e sua influência
na cognição do espectador, entretanto, no Brasil o número
de pesquisadores que se dedicam plenamente a estes temas ainda é
escasso. Deste modo, o presente texto procurou apenas abrir um pouco
mais a fresta da pesquisa a respeito da realização fotográfica
e cenográfica no cinema, através da análise de
fundamentais e esquecidas obras de Humberto Mauro no período
em que esteve no INCE.
6. Bibliografia
GOMES, Paulo Emílio
Salles. Humberto Mauro, Cataguases, Cinearte. São Paulo Perspectiva,
Edusp, 1974.
RAMOS, Fernão
Pessoa. Hirszman e Mauro, Documentaristas in Cadernos da Pós-Graduação,
Instituto de Artes, Unicamp, vol. 3, nº 2, 1999.
RAMOS, Fernão
Pessoa. Três voltas do popular e Tradição escatológica
do cinema brasileiro in Estudos de cinema: SOCINE II e III. São
Paulo, Annablume, 2000.
ROCHA, Glauber.
Revisão Crítica do Cinema Brasileiro. São Paulo,
Cosac & Naify, 2003
SCHVARZMAN, Sheila.
Humberto Mauro e as Imagens do Brasil. Tese de Doutoramento, Departamento
de História da UNICAMP, mimeo, 2000.
Notas
1."Fotografado
por Edgar Brasil, o mesmo que fizera Limite, - o filme de Mauro apresenta
uma qualidade igual à dos melhores fotógrafos de então
(...)" IN ROCHA, Glauber. Revisão Crítica do Cinema
Brasileiro. São Paulo, Cosac & Naify, 2003, pp.46.
2 RAMOS, Fernão
Pessoa. Hirszman e Mauro, Documentaristas in Cadernos da Pós-Graduação,
Instituto de Artes, Unicamp, vol. 3, nº 2, 1999, pp. 114.
3 RAMOS, Fernão
Pessoa. Hirszman e Mauro, Documentaristas in Cadernos da Pós-Graduação,
Instituto de Artes, Unicamp, vol. 3, nº 2, 1999, pp. 115.
4 SCHVARZMAN, Sheila.
Humberto Mauro e as Imagens do Brasil, Tese de Doutoramento, Departamento
de História da UNICAMP, mimeo, 2000, pg.5.
5 SCHVARZMAN, Sheila.
Humberto Mauro e as Imagens do Brasil, Tese de Doutoramento, Departamento
de História da UNICAMP, mimeo, 2000, pg.5.
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