No início dos anos 70, o campo cinematográfico foi marcado
pela dispersão do grupo de cineastas integrantes do Cinema Novo.
A repressão política pós Ato Institucional nº5
em 1968, a criação da Embrafilme em 1969, as novas demandas
do mercado cultural e o acirramento dos debates estéticos, compuseram
um novo quadro de atuação e contribuíram para o esfacelamento
do Cinema Novo.
Neste contexto, marcado também pela expansão da indústria
cultural e do consumo dos bens simbólicos no país, realizadores
e críticos redefiniram os marcos estéticos e políticos
do cinema brasileiro, rearticulando esquemas de produção
e projetos culturais. Surgiram diferentes, e às vezes conflitantes
opções estéticas, resultando em um amplo conjunto
de filmes e tendências: o crescimento da comédia erótica
(pornochanchada), o cinema marginal, e mesmo algumas obras nos marcos
do Cinema Novo.
Neste artigo vamos analisar uma tendência que foi a parceria, até
então inédita, entre cineastas e televisão a partir
da análise de um documentário. Neste contexto de cerceamento,
controle e censura da produção cultural, muitos cineastas
vislumbraram a possibilidade de trabalho em algumas emissoras de televisão.
Assim o objetivo é analisar um documentário exibido pelo
Globo Repórter em 24 de janeiro de 1978 chamado Caso Norte, em
um momento em que essa parceria estava firmada. A análise terá
também como objetivo identificar a estratégia de representação
cinematográfico do migrante pelo documentarista.
Antes de uma imersão no média metragem (38 minutos) de João
Batista de Andrade, na tentativa de análise de uma representação
do migrante nordestino, faz-se necessário uma reflexão sobre
o contexto histórico e televisivo que garantiu a produção
do filme.
A primeira particularidade do documentário/reportagem é
o fato dele ter sido produzido para a televisão dentro do programa
Globo Repórter Atualidade na Rede Globo de Televisão, em
1978. E, realizado como programa jornalístico, revela-se um documentário
cinematográfico experimental e inovador em sua dramaturgia. Por
este motivo tratarei aqui, antes da análise do filme, telejornalismo
na TV brasileira nos anos 70 para realizar tanto uma análise interna
- do filme propriamente dito - bem como sua relação com
o contexto em que foi produzido. Assim apresentarei inicialmente um breve
panorama crítico do telejornalismo na televisão brasileira,
especificamente do telejornalismo veiculado pela Rede Globo nos anos 70.
O percurso da
TV e do telejornalismo na década de 70
A Rede Globo, nessa década, já apresentava enorme abrangência
sobre o território nacional, inclusive com um caráter
monopolista. Dessa maneira, acabou por estabelecer um padrão
de qualidade que nos remonta ao fim da década de 60, quando então
é exibido o Jornal Nacional em 1º de setembro de 1969, a
primeira emissão jornalística em cadeia nacional.
A criação de um modelo próprio, em um contexto
de expansão da indústria cultural no Brasil, foi significativa
já que se configurava em uma experiência inédita
no Brasil. Segundo Maria Rita Khel "a Globo é efetivamente
a síntese da televisão brasileira na década de
setenta" .
Essa década foi marcada por um fato político anterior,
a decretação do Ato Institucional nº 5, que significou
o endurecimento da ditadura militar através da suspensão
de todos os direitos políticos e civis; a supressão da
liberdade de expressão e o consequente cerceamento dos meios
de comunicação. Na verdade, a partir daí, há
um controle total dos meios de comunicação pelo aparelho
repressivo do Estado.
A tentativa de integração nacional por intermédio
de uma política cultural, era um dos objetivos dos governos militares,
principalmente nos governos de Médici (1969- 1974) e Geisel (1974
- 1979). Tal política vislumbrava na televisão uma grande
possibilidade de integração via unificação
da linguagem, do consumo e da ideologia.
Esse interesse dos governos autoritários acabou por confluir
com a política de expansão e unificação
da programação da Rede Globo no início da década
de 70. No final da década, a Globo tornou-se então "o
produto mais bem acabado do acordo entre militares e burguesia"
.
Ainda segundo a pesquisadora Maria Rita Khel, integrar a nação
significava também, em termos políticos, "afinar
o coro dos descontentes de acordo com o tom ditado pela minoria satisfeita;
mas também significava incorporar setores marginais ao mercado,
padronizar aspirações e preferências, romper com
tradições regionalistas e modernizar hábitos de
acordo com as necessidades dos produtores de bens de consumo supérfluos
que se expandiram nesta década" .
Vale ressaltar que nesse processo de implantação de uma
política de integração nacional, há a instauração
de uma hegemonia do sudeste, do eixo Rio-São Paulo sobre todo
o Brasil, já que todas as emissoras ali se encontravam. Assim,
a televisão acabou lançando modelos de comportamento fabricados
em São Paulo e Rio de Janeiro para todo o território brasileiro.
Neste sentido, a idéia de integração nacional eliminou
qualquer possibilidade de veiculação de programas regionais,
ou pelo menos, programas específicos para cada região.
E até os dias atuais, é muito mais fácil e menos
custoso, retransmitir o sinal da Rede Globo do que investir em novos
programas que poderiam trazer à programação televisiva
uma diversidade maior com o envolvimento de produtoras independentes
e regionais. Somente em 1993 seria então criada em Curitiba a
CNT, primeira rede nacional de televisão com sede fora do eixo
Rio-São Paulo, mas ainda na região Sudeste.
Segundo Roberto Schwarz, a esquerda nos anos sessenta foi uma das principais
responsáveis pela produção cultural no Brasil.
A estética do subdesenvolvimento criada pelos produtores culturais
de esquerda como o Teatro de Arena, o Teatro Oficina, o Centro Popular
de Cultura da União Nacional dos Estudantes e o Cinema Novo com
a sua Estética da Fome, eram totalmente incompatíveis
com uma nova estética que se estabeleceu sobretudo a partir de
1973 com o Padrão-Globo de Qualidade. Segundo Kehl
"a opulência visual eletrônica criada pela emissora
contribuiu para apagar definitivamente do imaginário brasileiro
a idéia de miséria, de atraso econômico e cultural;
e essa imagem glamourizada, luxuosa ou na pior das hipóteses
antisséptica contaminou a linguagem visual de todos os setores
da produção cultural e artística que se propunham
a atingir o grande público."
Esse novo padrão estético ditou algumas normas também
na produção e veiculação de notícias.
No Jornal Nacional, além da fragmentação da informação
a assepsia, por intermédio da eliminação da pobreza
na imagem, foi característica marcante do telejornalismo da Globo.
O programa era composto de depoimentos e reportagens assim como entrevistas
editadas e enxutas para consumo rápido. Ou seja, a boa imagem,
do ponto de vista técnico e estético, acabou sendo adotada
como um dos principais critérios de seleção do
noticiário. Segundo Carvalho: "no Jornal Nacional, o povo
era bonito e bem alimentado. O otimismo, a idéia de um Brasil
Grande e decididamente unificado, riscado da lista dos países
subdesenvolvidos e agora encabeçando, graças ao 'milagre
brasileiro', o bloco dos intermediários, quase roçando
o desenvolvimento - esta era a imagem que o principal telejornal do
país deveria alimentar" .
A espetacularização, característica marcante da
TV brasileira, atingiu também o telejornalismo, principalmente
a partir do advento da TV a cores e com a adoção dos critérios
estéticos já assinalados.
Além desta característica, há uma outra mais importante
e que pode ser inferida a partir de uma frase que se tornou célebre,
atribuída ao presidente Emílio Garrastazu Médici
em março de 1973:
"Sinto-me feliz, todas as noites quando ligo a televisão
para assistir ao jornal. Enquanto as notícias dão conta
de greves, agitações, atentados e conflitos em várias
partes do mundo, o Brasil marcha em paz, rumo ao desenvolvimento. É
como se eu tomasse um tranquilizante após um dia de trabalho"
O presidente, referindo-se ao Jornal Nacional revela a função
anestésica do telejornalismo da Globo naquele momento cujo grande
exercício consistia "em diluir, ao máximo, o verdadeiro
impacto da notícia, transformando o Brasil em um país
desprovido de emoção" . Além, é claro,
de revelar a ação da censura sobre a programação
televisiva. Isto é, o telejornal era capaz de abordar no mesmo
tom e com a mesma inconseqüência notícias banais e
outras de extrema importância para o espectador, conferindo um
mesmo tratamento a fatos relevantes e irrelevantes. Com isso, mobiliza
em seus espectadores sempre o mesmo tipo de emoção.
Claro que a diluição da linguagem também aparece
como característica da linguagem televisiva, elaborada com a
preocupação de não se afastar de nenhum setor potencial
do mercado consumidor. A audiência é fundamental para a
sustentação da TV por intermédio da venda de espaço
de tempo para anunciantes. A televisão vivia, como hoje, do controle
e conhecimento das tendências de seu mercado consumidor.
Vale lembrar que o Jornal Nacional não foi o primeiro telejornal
significativo neste percurso da TV brasileira. O Repórter Esso,
porta-voz teleradiofônico dos revendedores Esso. Foi criado em
1953, três anos após a aparição do primeiro
programa de TV e inaugurou o telejornalismo, transferindo sua audiência
do rádio para a TV. Seu formato bastante pobre, formal e pouco
informativo com 15 a 20 minutos de programa em que o locutor lia as
notícias ao vivo, foi depois superado por outros telejornais
que trouxeram inovações em sua linguagem. Saiu do ar no
ano de 1970.Um dos telejornais, que inovaram em sua forma e conteúdo,
foi o chamado Jornal de Vanguarda, veiculado pela estação
de TV Excelsior e criado pelo jornalista Fernando Barbosa Lima, em 1962.
Segundo Carvalho, "O Jornal de Vanguarda rompeu com a linguagem
tradicional introduzindo vários locutores e comentaristas especializados
além de acrescentar humor e recursos do cinema de animação
em suas aberturas"
Em 1964 com o golpe militar, o telejornal passa a enfrentar sérios
problemas com o Estado Autoritário - censura, perseguições
e vetos dos órgão de segurança- e finalmente em
1968 com o AI-5, encerra sua experiência saindo do ar.
Com o aumento da ingerência e controle dos meios de comunicação
pelo Estado, programas são proibidos e algumas emissoras de televisão
saem do ar. A Rede Globo, amparada pela ditadura, vai apropriar-se de
toda uma revolução tecnológica em curso provocando
a sentença de morte do estilo Repórter Esso. A partir
daí inaugura-se um novo formato de telejornalismo com o Jornal
Nacional, que vai ao ar, não por mera coincidência, em
setembro de 1969, nove meses depois do AI-5.
A integração pela notícia coincidia com o endurecimento
do regime. Esta revolução tecnológica incluía,
principalmente, a incorporação de uma moderna engenharia
eletrônica que apontava para um futuro próximo um telejornal
completamente eletrônico. O aumento dos satélites de comunicação
beneficiaram a Rede Globo. Nesta década, a TV realmente serviu
e se serviu bem do momento de desenvolvimento - milagre econômico
- conjugando a apologia da modernização, a formação
de hábitos novos e de um público consumidor com o apoio
político garantido pela ditadura. E a Globo, emissora hegemônica,
"nas mãos de empresários modernos, soube navegar
nesse mar de ambiguidade por se colocar como líder do processo
dessa modernização conservadora da vida brasileira, o
ideal do progresso material sem distribuição de renda
vendido como ideologia por um elenco de astros inimaginável em
qualquer outro espetáculo brasileiro. "
Por essas razões é que o Jornal Nacional está intimamente
ligado à imagem de seu locutor-mestre. O profissional especialmente
trabalhado para dar credibilidade à notícia foi Cid Moreira,
"porta-voz impecável e quase sempre imune à emoção
fez parte, na verdade, de todo um projeto que caracterizava o novo estilo
de telejornalismo na década de 70".
Esse estilo, com algumas de suas características já assinaladas,
garantiu a construção da idéia ufanista de um país
embalado pela conquista do tri-campeonato mundial de futebol em 1970.
Abandona o estigma do subdesenvolvimento e adotava a máscara
do país 'em desenvolvimento' e do já referido milagre
econômico.
Tal cumplicidade criou condições para o aparecimento de
repórteres aduladores do governo autoritário. Esta relação
tornou-se comum em algumas emissoras na década de 70 e foi chamada
de função Amaral Neto para explicitar como era realizado
este mecanismo acima descrito. Amaral Neto, o repórter
"de jornalista tinha pouco, era na verdade um colunista oficial,
um adulador, um propagandista das realizações do regime.(...)
Apresentava ao telespectador a ufanista construção do
Brasil potência, passeava pela imensidão do continente
como o senhor da interpelação ideológica. Era como
se não parasse de repetir: 'Você é parte deste país
que vai para a frente.' Assim amarrava, atava os nós imaginários
entre a verdade jornalística e as justificativas da existência
da ditadura. A sua função foi indispensável ao
papel histórico que coube à televisão brasileira:
integrar a nação. Hoje a permanência da função
Amaral Neto indica que, essencialmente, a televisão mantém
suas prerrogativas ideológicas, fundadas durante o regime militar."
Walter Avancini foi alto funcionário da Globo durante sete anos
e principal responsável pelo núcleo das novelas até
o ano de 1979. Segundo ele seguidos anos da repressão
"facilitaram muito o comportamento empresarial da Globo, pois com
a ausência de sindicatos fortes e a impossibilidade de se reivindicar
direitos trabalhistas por meio de greves, etc., todo o trabalhador da
emissora foi obrigado a aceitar as precárias condições
que ela impunha. Qualquer reação podia ser considerada
subversiva".
A escolha dos profissionais que deveriam assumir cargos importantes
nas empresas jornalísticas sempre estava sujeita ao veto dos
órgãos de segurança. É ilustrativo o depoimento
do Ministro da Justiça Armando Falcão (1973-1979), afirmando
que o jornalista Roberto Marinho, dono da emissora, nunca havia lhe
dado nenhum trabalho nem lhe ocasionado nenhum incômodo na veiculação
das notícias e na cobertura dos fatos.
A conivência e a parceria entre a Globo e os militares garantiram
a renovação da concessão do canal, enquanto outras
concessões eram anuladas.
Entretanto, o sonho de um telejornalismo diário voltado para
a realidade brasileira não esteve afastado da década de
70. Ele se concretizou pela primeira vez em São Paulo, na recém-nascida
TV Cultura local. "Era um jornal pobre de recursos mas combativo
(...) provando que um bom telejornalismo é capaz de levantar
os índices de audiência de uma emissora".
Fernando Pacheco Jordão, um dos primeiros diretores do jornalismo
da TV Cultura, e que depois seria afastado do jornal a pedido dos militares,
criou o telejornal A Hora da Notícia, em 1972. Líder de
audiência na Cultura, o telejornal abordava assuntos de ligação
direta com o telespectador. O homem da rua era convidado a expor os
seus problemas antes das autoridades. Segundo Pacheco Jordão:
"nossa preocupação foi a de fazer um jornal de informação
mesmo, e não com aparência de informação.
Sem a preocupação de dar 30 fatos ao dia. Mas com a idéia
de selecionar, dentro de critérios que achávamos relevantes,
o que supúnhamos ser a necessidade de informação
do público."
O cineasta João Batista de Andrade, em depoimento dado em 1998
, descreve os métodos de filmagem e de cobertura jornalística
que foram desenvolvidos na TV Cultura ao longo de seu trabalho no Hora
da Notícia. Tais métodos acabaram sendo adotados também
na produção de documentários e por este motivo
desperta interesse nesta pesquisa. Sobre eles afirma:
"A visão que eu e Fernando Jordão levamos para a
Globo era a visão de uma democratização da tela
e de interesse pelos reais problemas da sociedade, em contraposição
a fantasias institucionais e à alienação dos noticiários
até aquele momento. Isso implicava, como ocorreu no Hora da Notícia,
na quebra de velhos hábitos, busca de uma visão independente
e não oficial dos fatos, mudanças nos conceitos de autoridade
na informação e uma nova eleição hierárquica
da importância dos fatos e assuntos."
Com o afastamento de Fernando Pacheco Jordão, assume a direção
do telejornalismo da Fundação Padre Anchieta em 1975,
o jornalista Vladimir Herzog. Neste ano apresentou à TV Cultura
um projeto visando a mudança na programação de
toda a linha da emissora. Entre os princípios básicos
estão a proposta de um jornalismo como, "instrumento de
diálogo, e não como um monólogo paternalista e
que espelhe os problemas, as esperanças, tristezas e angústias
das pessoas às quais se dirige. Um telejornal que não
adote uma atitude servil diante do governo. E uma política de
programação que vise objetivos prioritários, relacionados
com a realidade em que vive a porção de público
que se pretende atingir em determinado horário e em determinado
programa" .
Vítima de uma campanha de delação, Herzog foi preso,
interrogado, torturado e morto em outubro de 1975 no DOI-CODI paulista.
Sucumbia seu projeto de renovação do telejornalismo na
TV brasileira.
Entretanto, apesar de todo o contexto nada favorável a um jornalismo
televisivo plural e independente, foi dentro da própria Rede
Globo que surgiu uma das experiências mais relevantes na TV brasileira.
Além do Jornal Nacional, com ligação estreita com
a ditadura , a Rede Globo criou também em meados da década
de 70, o Globo Repórter, originário da série Globo
Shell. Único programa da emissora produzido com material cinematográfico,
teve o mérito de, em um curto período (1976-1983), fazer
passar, de uma maneira mais candente, informações boicotadas
pelos demais telejornais. O programa tinha a direção de
documentaristas importantes como Eduardo Coutinho, que viria a realizar
anos mais tarde o premiado documentário Cabra Marcado para Morrer
(1984), Paulo Gil Soares, Memória do Cangaço (1965), e
João Batista de Andrade. O Globo Repórter tratava de temas
polêmicos e de questões sociais em um período em
que tais temas eram proibidos e vetados pela Censura Federal. Estruturado
pelo cineasta Paulo Gil Soares (TV Globo/Rio) com outros cineastas,
a maioria documentaristas, o Globo Repórter foi a continuidade
da experiência do programa Globo Shell, também de cineastas
documentaristas.
Foi, desde sua criação, um dos programas mais importantes
do telejornalismo brasileiro. E os cineastas foram os responsáveis
pela sua criação. Em seus primeiros anos, o programa funcionava
separadamente da Central Globo de Jornalismo. As equipes trabalhava
com certa independência, pensando suas pautas e produzindo seus
programas com autonomia. Esses documentários cinematográficos
são autorais e muito diferentes da produção atual.
Mas essa experiência, em um contexto de autoritarismo e repressão,
não poderia durar muito tempo. Após produzir um documentário
intitulado 7 dias em Ouricuri, e sofrer retaliações e
censura interna por tratar do tema da seca, da fome e da miséria
no interior do Estado de Pernambuco, tais diretores foram afastados.
A partir daí o Globo Repórter passou a apresentar assuntos
não mais relacionados à realidade e pouco inventivos quanto
à linguagem. Mesmo a abolição da censura federal
ao telejornalismo
"não conseguiu devolver ao Globo Repórter sua aproximação
com o real, com o cotidiano da vida do brasileiro. Nos tensos dias de
maio de 1979, a equipe paulista do programa preparou o mais completo
documentário retratando a greve dos metalúrgicos do ABC.
Apesar de aprovado pela direção do Rio, o documentário
não foi ao ar. Foi vetado pelo próprio diretor das empresas
Globo, Roberto Marinho"
Neste episódio ficou evidente que os temas passavam pelo crivo
da direção da emissora. Assim, as reportagens sobre as
greves do ABC na grande São Paulo, só puderam ser veiculadas
após uma edição que fortalecia explicitamente a
posição patronal.
Para Luiz Carlos Maciel, ex-editor do Globo Repórter, quando
o programa passou para a área de Armando Nogueira em 1983, seu
estilo mudou completamente. "O programa deixou de ter o estilo
de documentário cinematográfico e passou a ser telejornalismo
igual aos jornais, descaracterizou aquela originalidade que o Globo
Repórter tinha. O Globo Repórter perdeu a personalidade."
* Adaptação
de capítulo da dissertação de mestrado "As
representações da diáspora nordestinas no documentário
brasileiro (anos 1970/80), defendida na Escola de Comunicações
e Artes - Universidade de São Paulo em 2003.
|