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Sue Ford (1943-2009): memórias de uma vida

por Fabiola Notari

"Ao lado da história escrita, das datas, da descrição de períodos, há correntes do passado que só desapareceram na aparência.

E que podem reviver numa rua, numa sala, em certas pessoas, como ilhas efêmeras de um estilo, de uma maneira de pensar, sentir, falar, que são resquícios de outras épocas." (BOSI, 1994, p. 75)

Quando descobri as fotografias de Sue Ford fiquei impressionada. Seus retratos me perseguiam como se fossem personagens de uma história já conhecida e que há muito tempo eu não me recordava. Lendo sobre um dos temas que mais me instigam – a memória –, encontrei na autora Ecléa Bosi a relação que criei com a fotografia de Sue Ford. Esses resquícios de um passado resignificados no presente são como pontes efêmeras que transformam a maneira de lidarmos com o presente, que mesmo sendo vivido, há sempre a sensação de que os tempos nos travessam por meio da expressão artística.

No site dedicado à fotógrafa, encontrei uma citação sua, que diz: "Há uma relação nada óbvia no meu interesse pela câmera, como eu gravo a mudança do tempo". A fotografia literalmente capta a luz e traduz em pretos, branco e meios tempos aquilo que a fotógrafa observada em determinado instante, mas a magia não se encontra no simples fato mecânico desse registro físico-químico, a fotografia torna-se o narrador desse tempo, mostrando ao observador-leitor uma outra maneira de ver e lidar com o mundo, seu tempo e espaço em constante transformação. Quando observamos um de seus trabalhos artísticos – fotografias e vídeo – somos colocados em situação provocadora, pois há uma grande troca entre as informações contidas nesses trabalhos e o conhecimento que possuímos em nosso contexto atual.

A série de fotografias das décadas de 1960 e 1970 foram as que consagraram Ford, com elas ganhou prêmios e fez diversas exposições individuais. Sua série Time Series é uma das mais conhecidas. Se na atualidade o retrato e o autorretrato são questões muito discutidas em diversas áreas do conhecimento, a produção fotográfica de Ford dialoga diretamente com esses questionamentos, pois nela a essência do ser humano em buscar compreender sua presença no mundo é capturada. Como Narciso em frente ao seu reflexo na água, admirando sua beleza efêmera, a fotografia torna-se uma maldição ao congelar essa imagem, pois nos confronta a passagem do tempo e suas bruscas mudanças, mostrando o quanto nossa existência é volátil, permanecendo apenas a imagem fotográfica, o passado impalpável num presente frágil, como a flor do mito acima citado.

 

Sue Ford - Annette, 1962; Annette, 1974 - 1962-1974, impresso em 1974 da série Time Series 1962-74

 

Sue Ford - Ross, 1964; Ross, 1974 - 1964-1974, impresso em 1974 da série Time Series 1962-74

 

Sue Ford - Denise Gipps, 1974

 

Sue Ford - Tony, 1974

 

Sue Ford - Carol, 1963

 

Sue Ford - Self-Portrait, 2004

 

 

Referências:

BOSI, Ecléa. Memória e sociedade: lembranças de velhos. São Paulo: Cia das Letras, 1994.

Sue Ford – photographer and artist

http://www.sueford.com.au/HISTORY.html

Acessado em 18 de novembro de 2015, às 9:40.

Flash – Sue Ford

http://www.ccp.org.au/flash/2009/11/sue-ford/

Acessado em 18 de novembro de 2015, às 10:50

 

Fabiola Notari é artista visual e pesquisadora. É doutoranda em Literatura e Cultura Russa no Departamento de Letras Orientais (DLO/FFLCH/USP) e mestre em Poéticas Visuais pela Faculdade Santa Marcelina (FASM/ASM). Leciona História da Fotografia e Fotomontagem no Curso Superior de Fotografia no Centro Universitário Belas Artes de São Paulo e coordena o Grupo de Estudos Livros de artista, livros-objetos: entre vestígios e apagamentos na Casa Contemporânea.

http://casacontemporanea370.com/article/Grupo-de-Estudos-Livros-de-artista-livros-objetos-.html

Currículo lattes: http://lattes.cnpq.br/1828197136276074