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Programa especial: Carta Branca à Unifrance | 34º Festival Internacional de Curtas Kinoforum

Programa especial: Carta Branca à Unifrance | 34º Festival Internacional de Curtas Kinoforum

Por André Quental Sanchez

 

Composta por 4 curtas selecionados pela Unifrance, o programa Carta Branca à Unifrance é composto por diferentes retratos da França contemporânea, nos fazendo refletir sobre temas como imigração, sexualidade reprimida e castas sociais.

 

Segundo Christine Gendre, chefe do departamento de curtas metragens da Unifrance, os curtas-metragens são uma forma de arte nobre e necessária. Assim, é necessário mostrar suas obras ao maior número de pessoas - tendo isto em conta, o programa Unifrance se inicia com o curta Duos (2022), de Marion Defer, no qual acompanhamos um casal de moradores de rua que invade uma casa luxuosa cujos proprietários saíram de férias. Quando os donos retornam inesperadamente, o casal percebe que eles são seus duplos.

 

Seguindo uma temática factível, apesar do absurdo de sua premissa inicial, o filme discute as relações de castas na sociedade francesa questionando este sistema que permite que poucos tenham muito e muitos tenham pouco, ao mesmo tempo que apesar das diferenças socioeconômicas, os dois casais lidam com dificuldades matrimoniais que serão relativizadas por meio de interações com seus duplos.

 

Marianne Maître e Pablo Pauly estão excelentes em seus papéis, fazendo ambos os seus personagens de maneira distinta, com traços e modos de comportamento que se diferenciam entre si.

 

(Duos, de Marion Defer)

Apesar da premissa de “gêmeos” abrir margem para a comédia, a produção faz isto em poucos momentos, dando mais foco à tensão sempre presente. Somos  surpreendidos pela revelação tanto quanto os protagonistas, e apesar do mal caráter deles, principalmente do homem, tememos pelo bem estar de todos. 

 

Em seguida, somos apresentados ao curta À Europa de Bidon (2022), de Samuel Albaric e Thomas Trichet. Nesta animação, acompanhamos o retrato de Bidon, um morador de um abrigo para sem tetos no subúrbio de Paris, e sua eficaz fuga de Lagos, auxiliado por um recipiente de água e um elefante que age como a sua consciência.

 

Fazendo uso de um universo lúdico que remonta à “A Vida de Pi” (2001), livro de Yann Martel adaptado para o cinema por Ang Lee, em que um animal selvagem representa a consciência do protagonista, acompanhamos Bidon sendo salvo diversas vezes ao escutar o elefante.

 

A animação faz uso do preto e branco para apresentar um contexto mais realista para a história. Ao fazer isto, entretanto, o curta perde força, ao contar uma narrativa onírica e fantasiosa por meio de uma estética realista.

 

 (O Lobo e a Gata, Jean-Sébastien Bernard)

 

Na temática de reflexões sobre a França atual, o curta O Lobo e a Gata (2023) conta a história de Loup, um menino surdo de 13 anos e a sua relação extremamente próxima com sua mãe. Esta convivência é colocada em conflito após a última demonstrar interesse em um salva vidas. 

 

O curta apresenta diversos detalhes que poderiam ser melhor explorados, tendo como ponto de partida a questão moral que está presente desde o nome do curta que remete à fábulas de Esopo como “A Raposa e as Uvas” e “O Cão e a Lebre” - do mesmo modo que, nas histórias clássicas, nos cativamos como observadores por diversos simbolismos presentes e ao final refletimos sobre as mudanças pelas quais passam seus personagens.

 

A direção de arte, a fotografia, as atuações e o design de som devem ser destacados, principalmente no momento em que ouvimos o grito da mãe pelo ponto de vista de Loup. Contudo, o maior destaque é o roteiro aguçado que constrói um arco para ambos os protagonistas e, por meio de uma estrutura simbólica, nos traz um curta amplo e maduro.

 

Finalizando o programa, temos a comédia Martingale (2023) de Marthe Verdet, em que acompanhamos a história de Oceáne, uma solitária mulher responsável por cuidar da piscina de uma mansão. Com o tempo, ela percebe que o reflexo da piscina faz cair homens do céu, usando isto a seu favor para nunca mais ficar sozinha.

 

O curta é sábio na escolha de uma protagonista feminina, de modo que a produção não seria eficiente caso ele fosse um homem - a inocência e sutileza da produção e, principalmente, da protagonista iriam se perder, abrindo margem para uma tensão e uma reflexão que não se encaixaria dentro do filme. 

 

A sutileza e a graça do curta se dá pela personalidade única de Oceáne, tendo em seu modo atrapalhado de ser, e em sua busca por um amor, traços de fácil identificação pelo público, graças ao forte carisma de Christine Gautier no papel principal

 

A cinematografia e a arte merecem um destaque - por meio de um plano da frente da mansão, percebemos o status de seus moradores do mesmo modo que, ao vermos Oceáne na esteira da piscina, percebemos inconscientemente sua infantilidade e característica sonhadora. Deve-se destacar também o excelente needle drop com o cover da música “It's Raining Men” da banda “The Penelopes” que resume a produção com maestria.

Os curtas selecionados pela Unifrance fazem uso de diferentes gêneros e linguagens para retratar o modo de vida e algumas das dificuldades apresentada pelos franceses da contemporaneidade. Todas as produções foram feitas por jovens cineastas emergentes, e se estes curtas servirem de referência, conseguimos notar uma sutileza, um cuidado grande e um futuro promissor para o cinema francês como um todo.

 

 

 

Biografia:
André Quental Sanchez é graduado em cinema na Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP), onde roteirizou e dirigiu um curta-metragem. Tem muito interesse na área do som, crítica e roteiro, tendo interesse e gosto pelo campo cinematográfico desde que se enxerga como gente. Pretende seguir vida acadêmica no futuro.

 

 

A cobertura do 34ª Festival Internacional de Curtas de São Paulo - Curta Kinoforum faz parte do programa Jovens Críticos que busca desenvolver e dar espaço para novos talentos do pensamento cinematográfico brasileiro.

Agradecemos à Atti Comunicação e Ideias e a toda a equipe da Associação Cultural Kinoforum por todo o apoio na cobertura do evento. 

Equipe Jovens Críticos Mnemocine: 

Coordenação e Idealização: Flávio Brito

Produção e Edição: Bruno Dias

Edição: Davi Krasilchik e Luca Scupino

Edição Adjunta, Apoio de produção e Transcrição das entrevistas: Rayane Lima