Arturo aos 30 (2023, Martín Shanly) | 47ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo

Arturo aos 30 (2023, Martín Shanly) | 47ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo

Por Marcos Kenji

O segundo longa-metragem do diretor argentino Martín Shanly é uma comédia coming of age que dramatiza a estagnação da geração millenial.

 

Arturo é um mero espectador da vida dos outros. No primeiro plano do filme, o protagonista fuma  sozinho, do outro lado da rua, enquanto algumas pessoas entram em uma igreja e bloqueiam a sua visão. Após a entrada da noiva, ele decide entrar e, sem mais nem menos, um voice over se inicia. Os diálogos rápidos observam que ninguém está investido na cerimônia: tem gente dormindo, mexendo no celular, e até um pássaro surge inquieto. Assim que a fatídica celebração se encerra, os convidados parabenizam os recém-casados e se organizam para ir à festa, que aconteceria fora de Buenos Aires. Arturo segue com algumas amigas, mas em um momento de distração, a motorista provoca um acidente. A despeito de Arturo e suas amigas sobreviverem, o choque provoca uma série de rememorações. 

 

A estruturação dramática é como a narração em um diário, alternando entre uma linha narrativa principal – a festa de casamento – e  flashbacks, que em geral se iniciam após ganchos de alta intensidade, como o acidente de carro. Nessas lembranças, é apresentado o mosaico de relações interpessoais do protagonista. A maior parte do humor é colocado a cargo dos diálogos e dos comentários irônicos e sinceros do protagonista, resgatados pelo voice over.

 

Se fosse para fazer uma comparação bem simplória, “Arturo aos 30” é uma mistura de Fleabag (2016, Phoebe Waller-Bridge) com as obras de Cooper Raiff, queridinho no circuito independente norte-americano. Assim como nas obras desses autores, o filme de Martín Shanly faz uma auto-ficção, em que se colocam conflitos característicos da geração millenial, como a dificuldade de se inserir no mercado, questões de gênero e sexualidade. O discurso do protagonista captura esses conflitos, dita o andamento do filme com comentários rápidos ácidos, em discurso direto.

 

E é aí que mora o maior problema: o protagonista. Arturo é um personagem que, aos 30 anos, está estagnado na vida. Ele passa sua vida cuidando da  irmã mais nova, alimentando hobbies e acompanhando outros personagens, inclusive para programas de que claramente não gosta. O protagonista é passivo, tanto em sua encenação quanto no que diz. Ele passa muito tempo ouvindo os problemas dos outros. Quando em atividade, os seus maiores conflitos envolvem a irmã e a noiva, que envolvem um humor baseado na vergonha alheia. E por isso, na maior parte do tempo, a despeito dos diálogos engraçadinhos, e ainda mais em contraste aos personagens de Phoebe Waller-Bridge e Cooper Raif, que têm um humor parecido, Arturo não é interessante.

 

Esse conflito criado entre uma encenação introspectiva e os comentários espirituosos criam uma estagnação formal, visto que as sequências se repetem de maneira incessante em esquetes. Os primeiros planos estabelecem que a história de Arturo será eclipsada pelos outros personagens e, conforme a narrativa se complexifica, essa situação muda poucas vezes. O desenlace até reintroduz essa questão com uma virada interessante, porém é tarde demais para a crônica de uma pessoa contando anedotas alheias que se arrastam por 90 minutos.

 

Assim, Arturo é representante de sua geração em seu pior: pessoas que foram pegas em um turbilhão de eventos e que não deixaram de estar imóveis. Talvez seja por alguma barreira linguística (já que a cabine foi exibida sem legenda) ou alguma identificação mais profunda, porém o humor dito ácido soa mais como deprimente e auto-depreciativo.

 

 

Biografia 

Marcos Kenji é graduado em Cinema pela FAAP, onde realizou quatro curtas-metragens nas áreas de som, arte e assistência de direção. No momento, está se especializando na técnica de som, com o objetivo de atuar na área e escrever com autoridade sobre o assunto. Tem um texto publicado na edição no 4 da Mnemocine.

 

A cobertura do 47º Mostra Internacional de Cinema São Paulo faz parte do programa Jovens Críticos que busca desenvolver e dar espaço para novos talentos do pensamento cinematográfico brasileiro.

Agradecemos a toda a equipe da Assessoria da Mostra por todo o apoio na cobertura do evento.

Equipe Jovens Críticos Mnemocine: 

Coordenação e Idealização: Flávio Brito

Produção e Edição: Bruno Dias

Edição: Davi Krasilchik e Luca Scupino

Edição Adjunta e Assistente de Produção: Rayane Lima