A relevância do documentário “Quando o Crioulo Dança” (1989)

Quando o Crioulo Dança é um documentário lançado em 1989 e dirigido por Dilma Lóes. O filme mescla imagens de movimentos negros e protestos no Brasil com pequenos trechos ficcionais. Estas lacunas ficcionais na evolução do filme servem como uma analogia com a personagem do negro no Brasil.

O objetivo do filme é mostrar, através de imagens de arquivo e dramatização as várias formas de racismo presentes na sociedade brasileira.

Um desses principais momentos históricos que é apresentado no filme, refere-se às imagens de manifestações do Movimento Negro no Brasil. O vídeo aborda o movimento de 1988, intencionalmente promovido no centenário da Abolição escrava no Brasil. Naquele dado momento, o movimento negro procurava pressionar o Governo brasileiro a dar mais visibilidade à população de cor do país.

De um ponto de vista político, o filme procura enaltecer os esforços feitos pela população negra brasileira de forma a se organizar em busca de direitos.Nesse aspecto, o êxito do filme está em mostrar a existência de movimentos sociais que lutam pela causa negra.Segundo a estudiosa Lelia Gonzalez, não foram muitos os movimentos negros de grande expressão no brasil. Alguns exemplos foram a FNB (Fronte Negro Brasileiro), o TEN (Teatro Experimental Negro) e o MNU (Movimento Negro Unido).

De acordo com Gonzalez, n o início dos anos 1930, a FNB (Fronte Negro Brasileiro) aparece como o primeiro "movimento negro" organizado no país. Contudo, a sua filiação com o governo e característica paternalizadora é bastante criticada pela estudiosa. Se atenta para o fato de que a FNB não respondeu às principais necessidades do povo negro. Por outro lado, temos na década de 1940, a fundação do TEN (Teatro Experimental Negro). Também criticado por Gonzalez, do mesmo modo que a FNB. A principal crítica é que esses primeiros movimentos se deixaram seduzir pela teoria da “democracia racial” (termo cunhado por Gilberto Freyre e adotado como discurso político pelo Governo brasileiro).

Finalmente, temos a criação do MNU (Movimento Negro Unido) em 1978. Este último pode ser relacionado mais diretamente com o filme. O MNU, de acordo com Gonzalez, foi de longe o primeiro movimento que estabeleceu claramente idéias relevantes sobre o papel do negro na sociedade brasileira. O MNU lutou pelos direitos do povo negro e tentou combater a idéia de democracia racial mostrando a verdadeira realidade da sociedade brasileira.

O filme é relevante em mostrar os esforços realizados pela comunidade negra para melhorar a vida e as condições do povo. O filme se aproxima da leitura de Gonzalez em outros pontos também. Primeiramente, a noção de que o problema racial está relacionado com a política e as estruturas econômicas do país (como também afirma Florestan Fernandes). Em segundo lugar, o racismo é tabu e a força da idéia de democracia racial permanece.

No entanto, o filme traz alguns outros aspectos do racismo no Brasil. Por exemplo, temos a noção de que a prática de racismo (como podemos ver em um dos depoimentos) é real. E em relação a isso, a negação do racismo é real, ao mesmo tempo. As pessoas reconhecem a sua existência, mas refutam ser parte dela.

O humor presente no filme é muito característico de como as pessoas lidam com seus problemas no Brasil. Até o título com duplo sentido, refere-se a isso. A palavra "dança" se refere ao ato de dançar, porém, no contexto do filme, se refere a um tipo de gíria que denota “se dar mal”. Ou seja, quando o homem negro "Dança", é quando os homens negros são vítimas de discriminação e racismo na sociedade

Referências:

FERNANDES, Florestan. Integração do negro na sociedade de classes. English: The Negro in Brazilian Society. Translated by Jacqueline D. Skiles, A. Brunel, and Arthur Rothwell. Edited by Phyllis B. Evelth. Publisher New York, Columbia University Press, 1969.

GONZALEZ, Leila. The Unified Black Movement: a new stage in black political mobilization. In: FONTAINE, Pierre-Michael (Editor). Race, Class and Power in Brazil. University of California, Los Angeles 1985

SKIDMORE, Thomas E. Black into white; race and nationality in Brazilian thought. Publisher New York, Oxford University Press, 1974.