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Morfologia, Sintaxe, Estilística e Dramaturgia

Por Fabio Durand

1. Morfologia

1.1. Campo
Aquilo que a câmera vê. No espaço, o campo tem a forma de uma pirâmide com o vértice no centro da objetiva.

1.1.1. Quadro
O retângulo resultante da projeção da pirâmide sobre uma superfície plana, seja o filme, seja a tela de projeção.

1.1.2. Ângulo de visão
A medida do ângulo formado pelo vértice da pirâmide, em graus. O ângulo de visão varia em função da distância focal da objetiva e das dimensões da janela sobre o filme. Como o quadro é retangular, os ângulos de visão horizontal, vertical e diagonal são sempre distintos. Uma objetiva é classificada em função de seu ângulo horizontal: chama-se “normal” quando este mede cerca de 40 graus, “tele” quando é menor e “grande angular” quando é maior.

1.1.3. Ponto-de-vista e câmera subjetiva
O local do espaço em que se encontra o vértice da pirâmide. Quando reproduz o ponto-de-vista de um personagem, chama-se câmera subjetiva.

1.1.4. Eixo (quebra de)
Distingue-se eixo visual da câmera de eixo dramático. O eixo visual é o próprio eixo geométrico da pirâmide, a direção para a qual a câmera está apontada. O eixo dramático, estabelecido pela relação entre dois personagens que se olham frente a frente, por exemplo, é fundamental para situar o espectador espacialmente. A quebra de eixo, nome que se dá ao salto do ponto-de-vista de um lado para o outro do eixo dramático, pode confundi-lo, portanto deve ser usada com cuidado. Equivale a mudar repentinamente a câmera que transmite um jogo de futebol para o outro lado do campo: o torcedor que assiste pela TV pode pensar que um gol marcado foi contra, pois não sabe mais para qual lado joga cada time.

1.1.5. Profundidade de campo
A dimensão do campo no sentido do eixo de visão. Em ótica, diz-se do intervalo entre o ponto mais próximo e o mais distante cujas imagens podem ser vistas com nitidez. Em linguagem cinematográfica, refere-se à visão simultânea de ações que se desenrolam a diferentes distâncias a partir do ponto-de-vista (ver “Plano”).

1.1.6. Off
Diz-se de toda ação que se desenrola fora do campo, mas que pode ser percebida seja pelo som, seja pelos seus efeitos visíveis causados nos elementos em campo.

1.2. Plano
O enquadramento do objeto filmado, com a dimensão humana como referência. Atenção: conforme o contexto, o termo plano pode ter outro significado (ver “Sintaxe”).

1.2.1. Plano geral (PG)
Abrange uma vasta e distante porção de espaço, como uma paisagem. Os personagens, quando presentes no PG, não podem ser identificados.

1.2.2. Plano de conjunto (PC)
Um pouco mais próximo, pode mostrar um grupo de personagens, já reconhecíveis, e o ambiente em que se encontram.

1.2.3. Plano médio (PM)
Enquadra os personagens por inteiro quando estão de pé, deixando pequenas margens acima e abaixo.

1.2.4. Plano americano (PA)
Um pouco mais próximo, corta os personagens na altura da cintura ou das coxas.

1.2.5. Primeiro plano (PP)
Enquadra o busto dos personagens.

1.2.6. Primeiríssimo plano (PPP)
Enquadra apenas o rosto.

1.2.7. Plano de detalhe (close-up)
Enquadra e destaca partes do corpo (um olho, uma mão) ou objetos (uma caneta sobre a mesa).

1.3. Posição de câmera

1.3.1. Plongée/Contra-plongée
Câmera posicionada em nível mais ou menos elevado do que o objeto enquadrado, respectivamente (em francês: plongée = mergulho). Também conhecido como câmara alta e câmara baixa.

1.4. Movimentos

1.4.1. Panorâmica (pan)
Rotação da câmera em torno de seu eixo horizontal (para cima e para baixo) ou vertical (para um ou outro lado).

1.4.2. Chicote
Uma panorâmica muito rápida.

1.4.3. Traveling
Deslocamento da câmera. Pode ser para frente (in), para trás (out), para cima, para baixo, para os lados ou combinado.

1.4.4. Zoom
Alteração gradual, dentro de um mesmo plano, do ângulo de visão. Chama-se zoom-in quando este diminui e zoom-out quando aumenta.

1.4.5. Traveling + zoom
Combinação dos movimentos descritos acima, normalmente em sentidos inversos.

2. Sintaxe

2.1. Plano
É a unidade significante mínima do filme. Entende-se por plano o trecho contínuo de filme contido entre dois cortes consecutivos.

Atenção: não confundir plano com tomada, que é a ação de filmar um plano. Em uma filmagem, podem ser feitas várias tomadas de um mesmo plano, das quais apenas uma será aproveitada.

2.2. Cena
Pode ser composta por um ou mais planos. São agrupados em uma mesma cena os planos que têm uma continuidade temporal e espacial entre si.

2.3. Sequência
Pode ser composta por uma ou mais cenas. Define-se pela continuidade da ação.

2.3.1. Plano sequência
Uma sequência sem cortes.

2.3.2. Montagem paralela
Montagem intercalando planos de sequências que se desenrolam simultaneamente, mas em espaços diferentes, normalmente convergindo para um encontro no final.

2.4. Relações entre planos

2.4.1. Campo/contra-campo
Alternância de planos orientados no mesmo eixo dramático, mas em sentidos opostos. Ver “Eixo (quebra)”.

2.4.2. Plano autônomo
Exibe uma ação que corre paralelamente às demais, sem encadeamento causal com o plano anterior e nem com o seguinte.

2.4.3. Efeito Kuleshov
Justaposição de planos com o poder de criar uma nova significação, inexistente nos planos isolados. O termo foi criado a partir de um experimento do cineasta russo Lev Kuleshov (1899-1970) em que um mesmo plano de um ator (Mosjoukine) com expressão neutra era alternado com planos carregados de diferentes significações afetivas (criança= “ternura”; mulhar num caixão= “tristeza”; prato de sopa: “apetite”), que “contaminavam” a interpretação dos espectadores, fazendo-os acreditar que sua expressão havia mudado. O poder do Efeito Kuleshov foi bastante superestimado nas décadas de 20 e 30 em função da valorização da montagem em detrimento de outros elementos da linguagem cinematográfica por parte de outros teóricos e cineastas russos como Sergei Eisenstein e Dziga Vertov.

3. Estilística (figuras de linguagem)
As mais importantes são:

3.1. Elipse
Supressão de um intervalo temporal e/ou espacial, que fica subentendido.

3.2. Metonímia
Recurso em que o todo é representado pela parte, o grupo pelo indivíduo, a causa pelo efeito, etc.

3.3. Gradação
Variação gradual ascendente (clímax) ou descendente (anticlímax) na intensidade dramática.

4. Dramaturgia

4.1. Ação
É o elemento central da dramaturgia (em grego: drama = ação). É ação tudo aquilo que pode gerar uma reação da parte de outros personagens. Neste sentido, os ocupantes dos assentos um ônibus lotado que permanecerem sentados a partir do momento em que entrar no veículo uma velhinha de muletas estarão desempenhando uma ação dramática que não depende de nenhuma ação física.

4.2. Personagem
É qualquer ser humano, animal ou ente inanimado ao qual sejam atribuídas características humanas (prosopopéia), capaz de desempenhar espontaneamente uma ação.

4.3. Conflito
A oposição das ações de diferentes personagens.

4.4. Peripécia
Inversão repentina no sentido da evolução dramática, causada pela mudança de intensidade das forças conflitantes (no futebol: “virada”). Em um drama, podem ocorrer inúmeras peripécias encadeadas.

4.5. Desenlace
Resolução do conflito levando à situação final, depois que uma das forças antagônicas sobrepuja a outra.

Roteiro para seminário realizado no curso Multimídia e Intermídia I do prof. Prof. Arthur Matuk – ECA/USP 05/11/1997.

Biografia
Fabio Durand é graduado em Cinema e Vídeo pela ECA/USP.

Os textos publicados em Mnemocine são propriedade de seus autores e podem ser cedidos para fins didático-pedagógicos mediante consulta prévia.

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