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Antonio Candido,  Anotações Finais (Eduardo Escorel, 2024)  | É Tudo Verdade 2024

Por Gabriela Saragosa

“Na madrugada de 12 de maio, oito meses antes dessa tarde de chuva em São Paulo, eu morri”. Nesse tom póstumo se abre Antonio Candido, Anotações Finais (2024), dirigido por Eduardo Escorel, que explora os diários que registram os últimos anos de vida de um dos maiores intelectuais brasileiros.

Através da marcante narração do ator  Matheus Nachtergaele, mergulhamos nos escritos de Candido, que abordam  desde a subjetividade da mente de um homem em seu nonagésimo oitavo ano de vida, até reflexões sobre os rumos políticos do Brasil em uma época marcada pelo declínio da democracia. Flutuamos entre a saudade que ele sente de sua falecida esposa, Gilda de Mello e Souza; seu sentimento de serenidade perante a ideia da morte, que ele teme que se transforme em ansiedade quando o momento de fato chegar; e suas previsões para o futuro do país após o afastamento de Dilma Rousseff da Presidência da República ― um futuro do qual ele pouco testemunhou.

Diversas imagens ilustram a narração. Imagens do apartamento de Candido, desabitado e silencioso, ainda que adornado por seus pertences ― incluindo estantes abarrotadas de cadernos ― conferem um caráter íntimo ao filme, além de, junto ao clima chuvoso que é ocasionalmente observado através das janelas do apartamento pouco iluminado, incorporarem a estranha sensação de serenidade diante da morte. O mesmo acontece com imagens das páginas do diário, que contêm sua caligrafia, e retratos de sua esposa, filhas e antepassados, oferecendo um olhar bastante pessoal sobre o professor que tanto contribuiu aos campos da sociologia e da literatura. A relação entre a narração e as imagens é arrematada pela construção sonora, ora um melancólico piano, ora uma sutil paisagem sonora que confere maior imersão a imagens da juventude e da família de Candido em Poços de Caldas. 

Anotações Finais é, acima de tudo, uma bela homenagem a Antonio Candido e uma oportunidade de vê-lo sob uma perspectiva mais íntima, não somente a partir de sua inteligência e bom humor, mas também pela lucidez que sua mente foi capaz de conservar por quase um século, escrevendo até seus últimos momentos. Em suas próprias palavras, “uma das coisas boas é reduzir a vida a palavras. Elas podem ser uma espécie de sobrevida”. 

Biografia

Gabriela Saragosa estudou Cinema no Centro Universitário Armando Alvares Penteado (FAAP), com experiência nas áreas de pesquisa, roteiro, direção, produção e direção de arte.

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A cobertura do 29º Festival Internacional de Documentário É Tudo Verdade faz parte do programa Jovens Críticos que busca desenvolver e dar espaço para novos talentos do pensamento cinematográfico brasileiro.

Equipe Jovens Críticos Mnemocine: 

Coordenação e Idealização: Flávio Brito

Produção e Edição: Bruno Dias

Edição: Davi Krasilchik, Luca Scupino, Fernando Oikawa e Gabriela Saragosa

Edição Adjunta e Assistente de Produção: Davi Krasilchik e Rayane Lima

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