Pianoforte é o mais novo longa-metragem do diretor e escritor polonês Jakub Piatek, que traz às telas – em um formato singular de documentário – os bastidores da imbatível e lendária Competição Internacional Chopin de Piano, que acontece a cada cinco anos em Varsóvia, Polônia, e reúne os mais talentosos pianistas de todo o mundo.
Por Rayane Lima
Pianoforte, dirigido por Jakub Piatek, acompanha a preparação de um grupo de diferentes pianistas prestes a competir na 18ª edição da renomada Competição Internacional Chopin de Piano – que acontece desde 1927 em Varsóvia, capital da Polônia -, onde, dos 160 participantes, apenas 10 chegam à última fase.
Em um modelo confundível com o ficcional, o documentário vai, aos poucos, inserindo o público na atmosfera do tão esperado evento, que aconteceu no ano de 2021. Ele conduz a construção de um ambiente requisitado, tenso e frenético até que apresenta seus personagens principais no ápice do nervosismo. Mesmo quem não tem familiaridade com o fenômeno encontra dificuldade em não se envolver na magnitude da ocasião.
Dos 160 participantes iniciais, Piatek traz atenção a seletas personalidades, de diferentes idades, que nos guiam por todo o processo que se estende por intensos 21 dias. Entretanto, o diretor não está preocupado em nos situar na trajetória desses pianistas até o esperado momento, mas sim sua inquietação nos bastidores e seus métodos de preparação para o holofote – que o site The Utah Review definiria como o “santuário interno” da competição.
As personalidades escolhidas por Piatek para liderarem o longa cativam instantaneamente o público com suas excentricidades e – principalmente – sua entrega total ao piano. Em poucas cenas, já é possível compreender naturalmente a individualidade dos jovens músicos; como o contraste gritante entre o carismático Marcin Wieczorek, 24 anos, que interage com a câmera sempre que pode, e a inabalável Eva Gevorgyan, de 17 anos, que em momento algum tem uma interação direta com a equipe de filmagem, e é apresentada a partir de sua relação conflituosa com a professora de piano e o foco integral na prática do instrumento.
Além dos competidores principais, o longa se mostra sensível ao estender seu foco para outros concorrentes que, apesar de não terem chegado à final da competição, não perderam o encanto e fascínio pelo piano. Um exemplo é a cena de um dos jovens recém-eliminados que, enquanto caminhava pelo aeroporto em direção a sua área de embarque, avista um piano e decide tocá-lo, atraindo uma multidão que o assiste com grande comoção.
O cuidado e a delicadeza da câmera podem ser notados em outros momentos da produção, quando capturam situações de vulnerabilidade dos participantes durante as apresentações e ensaios, permitindo que a cena flua e se desenvolva por si só. Deste modo, Piatek constrói uma narrativa de viés humanístico, que aproxima o espectador dos indivíduos documentados.
A trilha, que agrega músicas do renomado Chopin, exerce um papel fundamental nessa dinâmica de aproximação ao incorporar tanto o uso de sons diegéticos – que fazem parte ativa da cena -, como as melodias tocadas pelos competidores durante os ensaios e apresentações, quanto não diegética – que só os espectadores podem escutar -, criando assim uma ambientação mais dramática. Isso podemos notar quando Eva se encontra em um momento delicado após sua performance e, ao seu redor, os sons de diálogo ficam abafados, expondo o conflito interno da jovem de forma impactante.
Uma vez que o longa exige muitas camadas narrativas para sua construção – a vida corriqueira do elenco no período da competição, suas horas de ensaio, apresentação, etc. -, a montagem também se torna essencial para a clareza dos acontecimentos, e isso o documentário realiza com maestria, conectando cenas precisas que, em mínimos detalhes, contam exatamente o que o público precisa saber.
Por mais que o recorte de Pianoforte seja a preparação intensa dos pianistas nos bastidores desse grande evento, ele realiza um cuidadoso trabalho ao retratar essas jovens personalidades de um modo tão pessoal e honesto em uma situação que os torna completamente expostos. Sendo assim, por mais talentosos que sejam – o que para nós, espectadores, parece até um truque de mágica – eles também enfrentam seus altos e baixos mesmo exercendo algo que amam e os completa. Entretanto, encontram motivação, à sua maneira, para seguir em frente.
Pianoforte teve sua estreia no Festival Sundance de Cinema em janeiro deste ano, e conta com a co-produção do streaming HBO Max. O longa conquistou menção honrosa na competição internacional de longa ou média-metragens do Festival É Tudo Verdade.
Biografia
Rayane Lima é formada em jornalismo e sempre demonstrou muito interesse pela escrita, principalmente de livros e filmes. Hoje, ela estuda cinema na FAAP, combinando suas duas áreas de paixão.
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A cobertura do 28º Festival Internacional de Documentários É Tudo Verdade faz parte do programa Jovens Críticos que busca desenvolver e dar espaço para novos talentos do pensamento cinematográfico brasileiro.
Equipe Jovens Críticos Mnemocine:
Coordenação idealização: Flávio Brito
Produção e edição adjunta: Bruno Dias
Edição: Luca Scupino
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