Por Esther Menah
Após a produção da primeira temporada de Amazônia, Arqueologia da Floresta (2024), a diretora Tatiana Toffoli retorna para o segundo ano da série documental que aborda os diversos impactos da presença humana na natureza. Do achado de uma pequena pedra com desenhos nas escavações, até o soterramento de cachoeiras, árvores e moradias, as mãos da humanidade vêm modificando a natureza e originando obras e debates intermináveis.
Conhecida pela direção de documentários como Baré, Povo do Rio (2015) e Louceiras (2013), Tatiana Toffoli retrata a causa e a cultura indigena em suas produções, por vezes através da documentação do cotidiano e da tradição de diversas tribos na atualidade, e outras revisitando o seu passado, como é o caso da série produzida pela SescTV. O arqueólogo Eduardo Góes Neves, um dos principais pesquisadores da arqueologia da Amazônia e presidente da Sociedade de Arqueologia Brasileira (SAB), é o líder da equipe que, dessa vez, explora o sítio Teotônio, localizado em Rondônia. Motivados a encontrar peças cerâmicas e estudar mais a fundo a terra preta do local, a equipe arqueológica busca provas da ocupação humana no território para entender o modo como viviam esses habitantes. Utilizando uma explicação detalhada da terra e sua história, os integrantes oferecem uma visão precisa e minuciosa das camadas do solo, das formações geológicas e da interação dos povos antigos com o ambiente.
Tatiana Toffoli apresenta para o público não somente as falas de Neves, que conduz a pesquisa, sobre o projeto, mas também de cada membro que faz parte desse estudo. A visão plural em relação à exploração, ao solo e à terra, as motivações e histórias pessoais de cada um e os conhecimentos que compartilham enriquecem a narrativa, oferecendo uma perspectiva profunda sobre os povos que ali viviam em harmonia com a natureza.
Intercaladas com o registro do dia a dia dos arqueólogos e com os planos focados nas escavações, no solo gradiente da terra preta e dos pedaços de cerâmicas encontradas, as imagens da floresta complementam as cenas de forma marcante, seja através do céu em suas variadas cores, das águas do rio Madeira, ou da fauna e flora local. Já a trilha sonora, um elemento envolvente do episódio, vai além de apenas capturar os sons naturais do ambiente e dos instrumentais. A diretora opta por manter a autenticidade sonora da floresta, integrando o canto dos pássaros, o movimento das águas e o eco das ferramentas arqueológicas escavando o solo. Esses sons criam uma imersão no ambiente, uma profundidade sensorial para o espectador.
Para além da terra preta, um solo amazônico fértil, antrópico e composto por acúmulos de resíduos orgânicos, como protagonista da exploração, e um grande indício da permanência desses povos na região, o rio Madeira também é registrado como um dos principais motivos para a sobrevivência e moradia de tribos indígenas no local que remonta a mais de 6.000 anos atrás. Além do rio, Toffoli e os arqueólogos apresentam a história da enorme cachoeira de Teotônio, um antigo ponto de encontro de moradores e pescadores, que foi soterrada por conta da construção da Usina Hidrelétrica de Santo Antônio.
Ao revisitar sítios como Teotônio, eles não apenas redescobrem a história dos antigos habitantes, como também dão voz às memórias dos moradores atuais através de seus relatos, que ainda sentem a perda da cachoeira como um lugar de encontro, de vida e identidade. Essa perda não se traduz apenas em um espaço geográfico alterado, mas em uma comunidade fragmentada, onde muitos se viram obrigados a deixar para trás aquilo que um dia foi seu lar.
O impacto humano sobre a natureza é uma realidade que carrega consigo uma ambiguidade inevitável. Por um lado, há a capacidade de modificar, transformar, e até de destruir ambientes inteiros em nome do “progresso”. Por outro, há a urgência de reflexão sobre como essas ações afetam as gerações passadas quanto as futuras. Tatiana Toffoli e Eduardo Neves, juntamente com sua equipe, documentam essa terra explorada e habitada não apenas como uma testemunha do passado, mas também uma voz que precisa ser ouvida no presente, um solo que guarda histórias de uma moradia ancestral.
A série se torna um convite à reflexão sobre a responsabilidade que temos em relação ao nosso passado e ao futuro que estamos moldando. A cachoeira soterrada e o contato com a terra preta são lembretes de que, ao alterarmos a natureza, também mudamos a vida que dela depende — e que essa mudança deve ser ponderada com cuidado, para que não se apague as memórias, mas as integre em uma narrativa que valoriza e potencializa tanto o presente quanto o passado.
Biografia
Esther Menah é estudante de Letras e adora escrever e explorar os símbolos e as artes através da Literatura.
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Coordenação e Idealização: Flávio Brito
Produção e Edição: Bruno Dias
Edição: Davi Krasilchik, Luca Scupino e Gabriela Saragosa
Edição Adjunta e Assistente de Produção: Davi Krasilchik e Caio Cavalcanti
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