As Filhas do Fogo (2023, Pedro Costa) | 47ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo
Por Felipe Palmieri
As Filhas do Fogo (2023), novo curta-metragem do diretor português Pedro Costa, compõe a 47ª Mostra em exibições conjuntas ao primeiro longa do diretor, O Sangue (1989), em versão restaurada. O filme é uma experimentação que combina o musical e o documental em uma duração bastante curta, somando menos de dez minutos. Dada a natureza da linguagem adotada - com pouquíssimos planos e cortes - a sensação é de um filme menor ainda, mas ainda eficiente na observação do tema mais recorrente do diretor: a relação colonial entre Portugal e Cabo Verde.
Leme do Destino (2023, Júlio Bressane) | 47ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo
por Felipe Palmieri
Entender. Frequentemente este é o propósito de muitos ao se colocarem diante de uma tela de cinema. A disseminação de interpretações nunca foi tão simples e direta: como em teia, todos podem compartilhar suas visões lógicas sobre quaisquer obras. Em contraponto, negando a racionalidade, a coerência e a convenção, tem-se Júlio Bressane. Tal postura é análoga à obra do cineasta brasileiro, atuante desde a década de 60, que está na 47ª Mostra com dois filmes inéditos — A Longa Viagem do Ônibus Amarelo (2023, co-dirigido por Rodrigo Lima) e Leme do Destino (2023), enfoque deste texto.
Em Nossos Dias (Hong Sang-soo, 2023) | 47ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo
por Henrique Guimarães
O estilo de Hong Sang-soo é um dos mais reconhecíveis no cinema contemporâneo. Seus longos planos estáticos, que contemplam com igual relevância diálogos banais e profundos, estão em mais de trinta filmes do diretor, desde 1996. São obras reconhecíveis, porque basta um plano de Hong para compreender toda sua estética e filosofia. No entanto, seus dois filmes de 2023 trazem mudanças. Além de filmar Na Água com um desfoque na imagem, como nunca antes havia feito, realiza também Em Nossos Dias, no qual nem mesmo uma só história parece dar conta de tudo que pretende — por isso, Hong nos conta duas e, diferentemente de Conto de Cinema, por exemplo, elas nem mesmo se encontram no fim.
Paraíso em Chamas (2023, Mika Gustafson) | 47ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo
Por Giuli Gobbato
Irmandade e união feminina vão além de conexões de sangue. E, no mundo patriarcal de hoje, discutir a independência feminina no cinema segue indispensável, ainda mais quando se trata da juventude — uma tendência em diversos campos culturais, como evidente pela popularidade de grandes mulheres da indústria da música como Taylor Swift, que sempre reiteram a importância da força feminina. No longa sueco Paraíso em Chamas (2023), Mika Gustafson nos convida a testemunhar estes fortes laços de forma quase imersiva, nunca julgando as mulheres com as quais nos deparamos, seja como vilãs, seja como vítimas.
Pereio, Eu Te Odeio (2023, Allan Sieber e Tasso Dourado) | 47ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo
Por Felipe Palmieri
Selecionado para a 47ª Mostra, o documentário Pereio, Eu Te Odeio (Allan Sieber e Tasso Dourado, 2023) é resultado de um processo de mais de 20 anos. Com enfoque na vida e carreira do ator Paulo César Pereio, uma das figuras mais controversas e memoráveis do cinema brasileiro, o filme aproveita sua presença marcante em trabalhos como Os Fuzis (Ruy Guerra, 1964), Vai Trabalhar, Vagabundo! (Hugo Carvana, 1973) e A Lira do Delírio (Walter Lima Jr., 1978). Para tal, os cineastas se utilizam de imagens de arquivo que, combinadas com entrevistas e depoimentos sobre o ator, retratam Pereio como uma espécie de figura mítica. Concomitantemente, os próprios percalços da produção do documentário são incorporados à progressão narrativa.
Bons Sonhos (2023, Ena Sendijarević) | 47ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo
Por Fernando Oikawa Garcia
Embora ainda pouco conhecida, mesmo em circuitos cinéfilos, Ena Sendijarević é dona de uma obra dotada de impressionante coesão, ainda que breve. Nascida na Bósnia e tendo vivido uma série de mudanças até se radicar na Holanda, talvez seja por sua experiência enquanto imigrante que seus filmes tragam personagens ou em deslocamento constante — como no road-movie Me leve para um lugar legal (2019) —, ou em espaços de trânsito e impermanência — a loja de conveniência de Viajantes da Noite (2011,) ou os refugiados de Import/Export (2016). Habitar, portanto, nunca é em seus filmes uma questão simples ou pacificada. E dessa impossibilidade de existir plenamente nos espaços, surge em seus filmes uma consciência de um mal-estar civilizacional, o qual só pode ser respondido, no drama, através do estranhamento.