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Favela do Papa (Marco Antônio Pereira, 2023) – É Tudo Verdade 2023

A partir de imagens e áudios de época, intercalados a entrevistas atuais com os habitantes
da Favela do Vidigal, o filme Favela do Papa leva o espectador a entender não apenas o que
foi o movimento de resistência dos moradores contra a ordem de retirada na década de 70,
como também a importância do conceito de irmandade presente nesse território.

Por Victoria Neves

Nas palavras de Sérgio Ricardo, morador da favela do Vidigal (Rio de Janeiro, RJ) até o dia
de sua morte e importante músico para a bossa nova e para a cultura brasileira, “no Vidigal
tem uma turminha de bamba, (…) Se vem o mal, toda a favela se levanta, seja lá quem for
espanta”. Assim encontra-se a essência do filme dirigido por Marco Antônio Pereira, A
Favela do Papa, o qual irá retratar justamente a união presente entre os moradores da
comunidade e como isso foi relevante para o grande movimento de resistência que ocorreu na
década de 1970, quando uma política de remoção foi imposta pelo governo estadual.

Através de um laço entre união e resistência, o filme se constrói criando uma sensação de
revolta, uma vez que, por meio de imagens antigas e entrevistas atuais com figuras
importantes para a luta das comunidades, Marco Antônio Pereira explica a importância da
Favela do Vidigal na vida de seus moradores e a dor sentida por estes durante a tentativa
oficial de destruí-la.

Para que atinja tal emoção, o diretor faz uma viagem no tempo por dentro da favela,
entrevistando moradores mais velhos, que rememoram uma imagem de como o lugar
costumava ser. Com isso então, entende-se a importância do senso de comunidade que une os moradores, visto que todo o progresso feito dentro do Vidigal foi conquista de um trabalho
árduo e coletivo, que careceu de qualquer apoio do governo.

Assim, além da união para melhorar as condições de vida dentro da favela – como mutirões
de construção e acordo entre os habitantes -, os moradores passaram a se unir também em
termos relacionais, tornando-se uma grande família.

Em uma manhã de outubro de 1977, marcações na porta de algumas casas da favela do
Vidigal assustaram os moradores. Com apenas dias para retirar seus pertences e se preparar
para a remoção, não apenas os habitantes com as portas marcadas, mas também os vizinhos
destes começam a se organizar na busca por seus direitos de moradia. O diretor se inclina,
então, para uma visão mais subjetiva de como a ordem de retirada afetaria os moradores, suas
famílias e amigos. As filmagens antigas que retratam a revolta da comunidade acendem o
sentimento de indignação e as entrevistas atuais com os moradores relembrando da luta
coloca suas atitudes em perspectiva.

Após três anos de luta na justiça, o momento no filme em que se evidencia a vitória popular
contra a ordem de retirada faz o espectador vibrar, mesmo que tenha ocorrido há
aproximadamente 50 anos. Apesar do triunfo na justiça, o filme continua a retratar as demais
conquistas e desafios da Favela do Vidigal, sempre ressaltando a importância do senso de
comunidade.

Em 1980, a vinda do Papa João Paulo II para o Brasil contou com uma visita para o Vidigal e
esse momento foi determinante, essa exposição pública foi determinante, para que seus
residentes tivessem a oportunidade de mostrar-se como algo além dos estereótipos que lhe
são colocados e que a vitória na justiça não foi por acaso. O diretor, além de acentuar a
relevância política desse momento, não deixa de salientar a importância também para os
moradores. A notícia da visita do Papa foi motivo de novas construções civis, pinturas nas
casas e nas ruas, apresentação de músicas, noites sem dormir e novamente, a obra provoca
pelo menos um pouco da alegria e gratidão sentida pelos moradores na época.

Além do documentário, a luta dos moradores da Favela do Vidigal também já foi retratada no
filme Bandeira de Retalhos (2018) – dirigido, inclusive, pelo músico Sérgio Ricardo, que é mencionado no longa de Marco Antônio Pereira por sua grande relevância na luta contra a
política de remoção. Entretanto, A Favela do Papa, através da alternância de imagens entre o
presente e o passado, explica tanto a importância da luta dos moradores do Vidigal para o fim
da política de remoção em grande escala no Rio de Janeiro, quanto explora a história da
comunidade e das pessoas que nela convivem.

Biografia

Victoria Neves é estudante de Cinema no centro universitário FAAP. Completamente
encantada por tudo o que se relaciona à escrita e suas possibilidades, se dedica a escrita de
críticas de cinema, histórias e roteiros.



A cobertura do 28º Festival Internacional de Documentários É Tudo Verdade faz parte do
programa Jovens Críticos que busca desenvolver e dar espaço para novos talentos do
pensamento cinematográfico brasileiro.

Equipe Jovens Críticos Mnemocine:

Coordenação idealização: Flávio Brito

Produção e edição adjunta: Bruno Dias

Edição: Luca Scupino

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