Na Água (2023, Hong Sang-soo) | 47ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo
Por João Ferreira
São poucos os artistas que escondem suas obras atrás de uma parede de concreto. Menos ainda são aqueles que, por alguma razão, atestam ao público a existência de uma obra, mas optam por ocultá-la. Hong Sang-soo não se encaixa nem no primeiro, nem no segundo caso. O cineasta coreano, agora com mais de 30 filmes em sua longeva carreira, lança o que, à primeira vista, aparenta ser seu filme mais turvo, por optar em constituir praticamente todos os planos de um desfoque na imagem. A decisão de Sang-soo, entretanto, vai muito além de um simples véu linguístico. Tudo que o espectador precisa está em plano e nele se desintegrará.
Pedágio (2023, de Carolina Markowicz) | 47ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo
Por Caio Cavalcanti
O conflito entre o emergente mundo colorido de Antônio (Kauan Alvarenga), visto através de seus óculos cor-de-rosa, e a realidade cinza e retrógrada de Suéllen (Maeve Jinkings), sua mãe, é latente no novo longa-metragem de Carolina Markowicz.
Vampira Humanista Procura Suicida Voluntário (2023, Ariane Louis-Seize) | 47ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo
Por Giuli Gobbato
Se o gênero do coming-of-age remete a obras que frequentemente se equilibram entre o comum e o clichê, apresentar o gênero de forma distorcida é definitivamente admirável. É isso que alcança Ariane Louis-Seize com sua estreia de longa metragem, Vampira Humanista Procura Suicida Voluntário, que já se apresenta como releitura do gênero no título chocante e direto.
Folhas de Outono (Aki Kaurismäki, 2023) | 47ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo
por Henrique Guimarães
É possível introduzir Folhas de Outono, de Aki Kaurismäki, de várias maneiras, mas o primeiro contato com o filme sugere um estranhamento diante da história de Ansa e Hollapa, seus protagonistas. Os calendários marcam o futuro ano de 2024, mas os rádios trazem notícias sobre a contemporânea Guerra da Ucrânia. Já os celulares e as roupas não são atuais, assim como as fontes de luz e os filmes exibidos no cinema Ritz, frequentado por personagens que parecem sempre estar descobrindo algo novo – ou melhor, se conectando a sentimentos primários que lhes foram tirados pelo welfare state finlandês.
Afire (2023, Christian Petzold) | 47ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo
Os Amantes de Pompeia
Por Luca Scupino
Volta e meia nos encontramos diante de obras que desafiam nossa capacidade de percepção, que geram sentimentos conflitantes e parecem maiores que a habilidade de colocar uma impressão em palavras. Se há algo em comum nos filmes de Christian Petzold, talvez seja este sentimento. Embora sua obra, especialmente a partir de Phoenix (2014), beire a perfeição no que diz respeito ao domínio da encenação e na construção do drama, há nela um certo mistério, uma indefinição por sua ordem que escapa à mera codificação dos gêneros. Petzold parece unir a rigidez estética da tradição literária e cinematográfica alemã com uma abordagem moderna, autoconsciente de sua posição histórica e diretamente ligada ao mito.
Excursão (2023, Una Gunjak) | 47ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo
Por Fernando Oikawa Garcia
A adolescência é um período difícil. Diante do crescer, começam crises de identidade, o desejo sexual aflora e gera inseguranças, as relações com colegas de escola frequentemente são permeadas por crueldade. É esse universo o retratado por Excursão (2023), dirigido por Una Gunjak e representante da Bósnia no Oscar de Melhor Filme Internacional. Nele, Iman é uma jovem de quinze anos que se vê presa em sua própria mentira após contar, num jogo com colegas de sala, sobre uma suposta primeira relação sexual. A farsa ganha novas proporções e Iman a alimenta, inventa uma gravidez que se torna catalisadora de uma histeria coletiva, de pais a alunos. A premissa até acena para comédias populares, como A Mentira (2010, Will Gluck) ou Oitava Série (2018, Bo Burnham), mas Gunjak dá tratamento sóbrio a este coming-of-age que opera sob a lógica da angústia crescente: o resultado de uma radiografia dos modos como uma sociedade conservadora trata o desejo feminino.